Qual é seu impacto na ciência?

Hoje em dia se fala muito em número de seguidores, número de curtidas e o que levaria um vídeo, por exemplo, a se tornar viral. Esses conceitos são indicadores de fama ou impacto. Já no mundo acadêmico, muito se discute sobre como divulgar pesquisas para a comunidade científica.  Mas como se mede impacto na academia?

Motivação: este post foi motivado pelo nosso Simpósio de Comunicação Científica e impacto, que ainda vai rolar no CBMz em setembro. Aproveitando, se você quiser saber mais sobre o evento, clique aqui!

Já abordamos aqui no blog as métricas de impacto da blogosfera. Mas e o impacto dos artigos publicados em periódicos? Essa pergunta se desdobra em várias outras, com diversas implicações para todas as pessoas envolvidas profissionalmente com a ciência.

Qual é o seu impacto na ciência enquanto aspira? Provavelmente, o seu orientador te pede que, no seu doutorado, você publique em uma revista indexada e de alto impacto. Mas como se mede isso? O que é aceitável em termos de nível de impacto para uma tese de doutorado possa ser defendida? Essa última pergunta é capciosa, pois quase 90% dos artigos submetidos para revistas de alto impacto (tipo as do grupo Nature) são rejeitados. Isso significa que nem todo artigo de qualidade “cabe” em uma revista de alto impacto.

A seguir comento algumas métricas de impacto (ou indicadores) comumente utilizadas  na Academia. Basicamente, pode-se medir o impacto de diferentes personas acadêmicas: a revista, o artigo ou o cientista individual. Além disso, hoje é possível medir impacto tanto da maneira tradicional, dentro do círculo acadêmico dos periódicos, ou em uma esfera mais ampla (altmetrics), abrangendo diversos cantos da internet, como redes sociais, blogs e sites.

Vamos ver então alguns conceitos e métricas fundamentais relacionados ao impacto científico.

Citação

Uma citação tem o poder de fazer os olhos dos cientistas brilharem. Ela ocorre quando alguém menciona uma informação do seu artigo em um outro artigo, fazendo uma espécie de tag acadêmica. Algumas ferramentas automatizadas podem inclusive avisar um pesquisador toda vez que ele é citado em um novo trabalho. O número de citações pode ser reportado no nível da revista, do artigo ou do cientista, ou até mesmo de uma instituição ou país. Por exemplo, o número médio de citações por artigo no Brasil em 2015 foi 42, enquanto que no Chile foi 59. “Perdemos” para os nossos hermanos nesse quesito (pelo menos não foi de 7 a 1)!

Uma citação pode valer mais ou menos, dependendo de quem cita o meu artigo. Por exemplo, se eu me auto menciono eu estou fazendo auto-citação. Se a maioria das minhas citações forem feitas por mim mesma, a validade do número de citações que eu tenho pode ser pouco reconhecida. A revista PLoSONE, por exemplo, em 2018 foi citada mais de 200 mil vezes, sendo que auto-citações ocorreram em pouco mais de 9 mil vezes. No caso, auto-citações são casos em que artigos da PLoSONE citaram artigos da PLoSONE. Quando a esfera de análise é a revista, o número de auto-citações pode simplesmente refletir a “panelinha” de autores que leem a revista mais assiduamente e acabam citando mais artigos da mesma.

JCR

O JCR (Journal Citation Reports) é um módulo dentro da ferramenta InCites que permite avaliar e comparar periódicos (revistas científicas) usando dados de citações. O JCR extrai dados de milhares de revistas científicas (~120.000), revistas técnicas e subprodutos de reuniões científicas, como anais de congressos, cadastradas na plataforma Web of Science. Todas essas bases de dados são mantidas pela corporação Clarivate Analytics (antigamente, estavam nas mãos da Thomson Reuters e, originalmente, do Institute for Scientific Information). Com o JCR é possível comparar o número de citações de diferentes revistas, avaliando o desempenho delas ao longo do tempo. Eles também permitem, a partir de alguns destaques, procurar por temas de alto impacto, ou mesmo por uma revista ideal que atenda aos seus objetivos de publicação. O meu orientador sugeriu fortemente que eu publicasse pelo menos 1 artigo em uma revista com impacto ≥ 4 no JCR durante o doutorado, para que eu ficasse competitiva o suficiente para conquistar um bom emprego após a defesa. Não sei como ele calculou esse número, mas dentre os 40 jornais mais bem rankeados em Ecologia nos últimos anos, todos tinham JCR > 3.

Índice H

O índice H padrão é bem simples (hoje há dezenas de variantes dele). Se você tem H = 2, isso quer dizer que você tem 2 artigos que foram citados cada um pelo menos 2 vezes. Legal, né? Facinho de interpretar. Para saber o seu, basta você entrar no Google Acadêmico e se cadastrar lá com um email institucional. O Google Acadêmico oferece alertas super úteis para quando você tiver uma nova citação, ou mesmo para quando aquele autor que você tanto curte publicar um novo artigo. O valor desse índice, assim como o de todos os outros, depende da base de dados usada. Logo, cada cientista tem um valor H diferente no Web of Science, Google Scholar e Scopus.

Índice i10

O índice i10 é uma variação do índice H. Ele diz quantos artigos de uma pessoa têm 10 ou mais citações. Conseguir 10 citações para um artigo não é nada fácil. Só para você ter uma ideia, a mediana de citações por artigo na área de Ecologia atualmente é igual a 2.29, segundo o JCR 2018. Esse índice também pode ser usado para comparar revistas.

É claro que, quanto mais velhos ficamos, a tendência é acumularmos mais citações. Por isso o tempo deve ser levado em conta quando se avalia uma pessoa e seu impacto científico. Uma pessoa que ainda nem defendeu o doutorado, tipo eu, vai ter muitíssimo menos citações do que seu orientador (veja o Miltinho). Na real, hoje eu tenho 2% do número de citações do meu orientador! Haja impacto…

Por isso, é interessante acompanhar a evolução das suas métricas de impacto ao longo do tempo, mas não necessariamente ficar se comparando toda hora com pessoas que tem uma produtividade surrealmente alta (os outliers), especialmente se eles forem de gerações diferentes. Cada um é cada um e cada jornada é uma jornada.

Altmetric

Altimetric se refere a “alternative metrics”. Ou seja, medidas alternativas de impacto que consideram as redes sociais e o contexto geográfico dos leitores de um trabalho, incluindo o uso das informações científicas por sites, blogs, vlogs, podcasts e diferentes meios de comunicação online.

Essas métricas facilitam a vida do cientista preguiçoso ou ocupadíssimo com suas tarefas acadêmicas, que quer ver no smartphone qual é o artigo “mais quente do momento”, enquanto aguarda o voo para aquele congresso no Alaska. Vocês podem conferir o Altmetric do Atlantic Mammal Traits, o data paper mais lido da série Atlantic, que nesse momento chega a 72. As informações do Altmetric revelam que as pessoas que mais procuram por esse data paper estão no Brasil, EUA e Espanha. Além disso, os leitores são na maioria membros do público (52%), cientistas (41%) ou comunicadores de ciência (jornalistas, bloggers, editores).

Eu não sei qual é a mágica usada para produzir esse índice, mas que ele é interessante, isso é!

Kardashian index

Muita gente usa o Twitter para se atualizar rapidamente sobre o que vem acontecendo em seus temas favoritos. Eu sou uma dessas pessoas e confesso que tenho mixed feelings sobre o uso do Twitter como news feed acadêmico. De qualquer forma, é nele onde eu tenho mais procurado notícias acadêmicas :-).

O Kardashian index é gerado a partir do número de seguidores de um pesquisador e do seu número de citações. E, sim, o nome dele vem da Kim Kardashian, aquela socialite americana. Ele supõe que o número de citações de um cientista no Twitter seria um bom indicador da qualidade da produção da pessoa, o que é bem polêmico. Citando a Wikipedia, “um índice K alto indica uma fama científica exagerada, enquanto um índice K baixo sugere que um cientista está sendo desvalorizado”. Para calcular o seu índice K, basta acessar este site e colar as suas IDs do Google Scholar e do Twitter.

E aí, o que você achou dessa medida de impacto? Confesso que ela me parece meio tola.  Tem tanto pesquisador excelente que nem usa Twitter. Mas, enfim, estou dentro da panelinha global que usa. Investir em fazer ciência de qualidade e em “ser” famoso no Twitter são duas tarefas que tomam tempo, e eu já escolhi a que mais me atrai, rs. Nada contra quem quer atingir um índice K alto, mas será que essa busca por popularidade nas redes sociais, ainda que acadêmicas, não teria um lado sombrio?

RG-score

Esse é o numerozinho que fica ao lado do seu nome no ResearchGate. Ele é atualizado semanalmente e aumenta conforme você vai incluindo suas contribuições científicas no ResearchGate, sejam elas publicadas em revistas indexadas ou não. Também contribuem para o seu RG-score as perguntas que você responde dentro dessa rede social acadêmica, os updates de projetos que posta e até mesmo o seu número de seguidores. Não sei o que achar desse índice, mas fico felizinha quando ele sobe.

Conclusão

Espero ter esclarecido algumas medidas de impacto científico para vocês. É muito legal ter esses indicadores para checar nosso progresso acadêmico ao longo do tempo. Quando achamos um índice minimamente confiável, também podemos utilizá-lo para selecionar possíveis universidades para se visitar e orientadores com os quais podemos desenvolver novas pesquisas, tipo onde e com quem poderíamos fazer nossos mestrados  e doutorados sanduíche. Pelos índices podemos filtrar nossas escolhas, e eles podem ser um bom ponto de partida para essa seleção. Claro que uma medida de impacto não precisa ser o fator decisivo para escolhas grandes como essas, mas que eles ajudam, ajudam. Gostaria muito de discutir a lógica, assim como os prós e contras desses indicadores com vocês. Que erros vocês acham que esses índices podem ter? Que tendências eles podem criar? Estamos usando estes índices corretamente? Comentem aqui embaixo!

Até a próxima, e busquem conhecimento!

Fonte da imagem: CNN